Painel Científico para a Amazônia lança Sumário Executivo de Relatório de Referência sobre a Amazônia
Com mais de 200 renomados cientistas da Amazônia e parceiros globais, entre os quais cientistas da Coalizão Ciência e Sociedade, o Painel Científico para a Amazônia (The Science Panel for the Amazon-SPA) desenvolveu uma avaliação científica abrangente de referência sobre o estado da Bacia Amazônica. O processo incluiu diálogos com Povos Indígenas e comunidades locais sobre as ameaças que eles estão enfrentando, e oferece soluções e trajetórias em direção a um desenvolvimento sustentável para prevenir eventos catastróficos.
Por ocasião da 76a. Assembleia Geral da ONU, o Painel Científico para a Amazônia (The Science Panel for the Amazon-SPA) lançou em 20 de setembro o Sumário Executivo do Relatório de Análise da Amazônia. Como uma avaliação científica única do estado da Bacia Amazônica, as recomendações do Relatório oferecem caminhos ao desenvolvimento sustentável para formuladores de políticas e governos e um apelo enfático por ações imediatas.
O Relatório do SPA fornece uma visão sistemática sobre o estado dos ecossistemas e dos povos da Amazônia e oferece aos formuladores de políticas públicas recomendações para a conservação da Amazônia baseadas na ciência, enquanto avança nos caminhos de desenvolvimento sustentável para a região. O Relatório do SPA destaca a importância da ciência, tecnologia, inovação, dos povos indígenas e do conhecimento local para orientar tomadas de decisões e a formulação de políticas.
Um olhar mais atento
O Relatório SPA foi desenvolvido por mais de 200 cientistas, dos quais dois terços são de países amazônicos, incluindo cientistas indígenas. Inspirado no Pacto de Letícia pela Amazônia, o Relatório é o mais aprofundado, abrangente e integrador sobre a Amazônia. O SPA também visa ter relatórios sistemáticos e consistentes no futuro.
A Bacia Amazônica engloba a maior floresta tropical do mundo e é uma região de imensa riqueza e diversidade natural e cultural, mas está enfrentando mudanças sem precedentes.
A Bacia Amazônica possui uma notável parcela da biodiversidade global, única e insubstituível. Essa extraordinária diversidade confere estabilidade e resiliência aos ecossistemas terrestres e aquáticos, que são produtos de uma dinâmica complexa que coevoluiu há milhões de anos. O bioma Amazônia é um dos elementos cruciais do sistema climático terrestre, desempenhando um papel decisivo nos ciclos globais de água e regulação da variabilidade climática. Uma quantidade significativa de umidade flui para o sul através de “rios aéreos” e se constitui em uma importante fonte de água para os ecossistemas além da Bacia Amazônica. A região também é responsável pela maior descarga fluvial do planeta, respondendo por cerca de 16 a 22% do total de rios que chegam aos oceanos no mundo. A Amazônia é também um significativo sumidouro de carbono, armazenando aproximadamente150 a200 bilhões de toneladas de carbono em seus solos e vegetação.
A Amazônia abriga cerca de 47 milhões de pessoas, incluindo cerca de 2,2 milhões de Indígenas, distribuídos em mais de 400 grupos que falam mais de 300 línguas. Populações Indígenas e Comunidades Locais (PICLs) desempenham um papel fundamental na conservação e na gestão sustentável da diversidade agrícola e biológica da Amazônia, bem como dos ecossistemas. No entanto, os povos amazônicos, suas culturas e conhecimentos estão sob ameaça devido às múltiplas pressões e ao enfraquecimento da proteção de seus direitos.
A cientista Mercedes Bustamante, integrante do SPA e da Coalizão Ciência e Sociedade, acrescenta: “Com os recentes surtos de desmatamento que estão devastando a mais extensa floresta tropical do planeta, devemos também anunciar um alerta vermelho para a Amazônia. Salvar as florestas do desmatamento e degradação contínuos e restaurar os ecossistemas é uma das tarefas mais urgentes de nosso tempo para preservar a Amazônia e suas populações, e enfrentar o risco global e os impactos das mudanças climáticas. O mosaico de ecossistemas amazônicos se estende desde os altos Andes até a planície amazônica e abriga a biodiversidade mais extraordinária da Terra, com mais de 10% das espécies vegetais e animais em todo o mundo”.
Amazônia à beira de um ponto de inflexão
A situação na Amazônia é extremamente preocupante, já que a região está se aproximando de um potencial e perigoso ponto de inflexão (não retorno) devido ao desmatamento, degradação e mudanças climáticas. Aproximadamente 17% das florestas amazônicas foram convertidas para outros usos da terra e pelo menos outros 17% foram degradados. Os especialistas estimam que 366.300 km2 de florestas foram degradados entre 1995 e 2017, e todos os anos milhares de hectares de florestas, a maioria degradadas, queimam em toda a Bacia Amazônica à medida que os incêndios escapam de pastagens próximas ou áreas recentemente desmatadas.
O SPA alerta os tomadores de decisão a agirem agora e recomendam uma moratória imediata do desmatamento em áreas que já estão atingindo o ponto de inflexão, e zero desmatamento e degradação da floresta em toda a região amazônica até 2030.
Construindo resiliência
O SPA demonstra a relevância da restauração de ecossistemas terrestres e aquáticos, da conservação da biodiversidade em áreas naturais e manejadas, e da diversidade cultural, bem como do monitoramento do desmatamento, degradação e estabelecimento de sistemas de alerta precoce de incêndio. Manter a resiliência da Amazônia também requer uma ação global para interromper as emissões de gases de efeito estufa. Embora a mudança no uso da terra seja a ameaça mais visível para os ecossistemas amazônicos, a mudança climática está emergindo como uma das ameaças mais insidiosas para o futuro da região.
Soluções e um caminho a seguir: uma Amazônia viva
Apesar da situação crítica da Bacia Amazônica, o SPA também destaca o potencial significativo de avanço nas trajetórias de desenvolvimento sustentável com base em uma combinação de pesquisa científica, conhecimento dos povos indígenas e comunidades locais e ênfase no poder de parcerias colaborativas regionais mais fortes.
O SPA desenvolve a visão de uma Amazônia viva que avança com iniciativas de restauração e uma transformação para uma nova bioeconomia dinâmica que respeita e reconhece os ciclos da natureza e os direitos humanos, particularmente dos PICLs.
A proteção e o fortalecimento dos direitos dos PICLs também são vitais para preservar as florestas e a biodiversidade e combater as mudanças climáticas. O surgimento de uma nova bioeconomia de florestas e rios saudáveis na Amazônia deve ser apoiado por políticas ambiciosas baseadas no diálogo multicultural, intercâmbio de sistemas de conhecimento e boa governança para coibir atividades ilegais e os por elas provocados. Avançar nas vias de desenvolvimento sustentável e desmatamento e degradação zero na Amazônia até 2030 depende dos combinados e colaborativos dos formuladores de políticas para a Amazônia nacional e subnacional, dos setores financeiro e privado, da sociedade civil e
“Nossa mensagem aos líderes políticos é que não há tempo a perder”, disse Carlos Nobre, co-presidente do SPA. “O atual modelo de desenvolvimento está alimentando o desmatamento e a perda da biodiversidade, levando a mudanças devastadoras e irreversíveis. Para que a Amazônia sobreviva, devemos mostrar como ela pode ser transformada para gerar benefícios econômicos e ambientais que seriam o resultado de colaborações entre cientistas, detentores do conhecimento Indígena e seus líderes e governos”.
O Coordenador das Organizações Indígenas da Bacia do Rio Amazonas (COICA) José Gregorio Diaz Mirabal acrescenta: “Vamos salvar a humanidade. Vamos superar essa crise econômica, climática, alimentar e de saúde e essa extinção da biodiversidade respeitando este Relatório. Só o que falta é o apoio dos governos, bancos, empresas e de toda a humanidade”.
O SPA e a Coalizão Ciência e Sociedade
Sete cientistas da Coalizão Ciência e Sociedade integram o Painel Científico para a Amazônia. São eles: Carlos Nobre (USP), co-presidente do SPA, Mercedes Bustamante (UnB), Erika Berenguer (Universidades de Oxford e Lancaster), Joice Ferreira (Embrapa Amazônia), Paulo Artaxo (USP), José Marengo (Cemaden), Adalberto Val (INPA).
Link para download do Sumário Executivo de Relatório de Referência sobre a Amazônia: https://www.theamazonwewant.org/scientific-literature/
Foto: Bruno Cecim/Ag.Pará